“Algumas considerações acerca do novo estudo sobre o desempenho dos cotistas da UERJ” ou “Avaliando os cotistas da UERJ”
Por Helio Ventura*
Julho de 2004
É curioso como, dependendo da situação e do interesse, as coisas podem ser direcionadas. Estou realmente intrigado com o que li nestes últimos dias. Tem circulado nos principais veículos de comunicação do país a informação de que uma pesquisa mostra que na UERJ há mais cotistas entre os alunos reprovados, ou seja, que o desempenho acadêmico dos estudantes que entraram pelo sistema de reserva de vagas para negros e estudantes oriundos da rede estatal de ensino foi inferior aos demais alunos no primeiro semestre de 2003. Isso contradiz outro estudo, realizado no ano passado, que mostrou, pelo contrário, que cotistas tiveram desempenho melhor do que não-cotistas quando se comparou a taxa de aprovação em todas as disciplinas cursadas.
Esta discrepância se deu pois o novo estudo, feito a partir do rendimento dos mesmos estudantes, comparou a taxa de reprovação por nota dos alunos.A diferença acontece porque o atual estudo, feito na gestão da reitoria que assumiu este ano a UERJ, "preferiu" trabalhar com a taxa de reprovação apenas por nota (alunos que não abandonaram as disciplinas que cursavam e que tiveram nota insuficiente para serem aprovados). A comparação, no entanto, não levou em conta os alunos que abandonaram a disciplina e, por isso, tiveram nota zero nas provas. Quando esse grupo é comparado, os dados são: 6,9% dos cotistas foram reprovados dessa maneira ante 13,7% de taxa entre os demais estudantes. Na comparação da média das notas, calculado pelo CR (Coeficiente de Rendimento), cotistas e demais alunos têm desempenhos parecidos. A Sub-Reitora de Graduação da UERJ defende que a melhor maneira de comparar a nota é analisando a taxa de reprovação, pois um aluno que abandonou uma disciplina por falta e ficou com CR zero pode ter desistido da aula. Considero isso uma manipulação de dados, numa tentativa deliberada de demérito à implantação de políticas de ação afirmativa e ao sistema de cotas em particular. Observemos que se as estratégias de permanência aos alunos cotistas, imprescindíveis para o amplo sucesso da medida de reserva de vagas, estivessem sendo realizadas pelo Estado, pela própria Universidade, ou ainda por uma atuação conjunta de ambos, o quadro certamente seria outro.
Primeiro, este estudo considerou - ao meu ver, de forma equivocada - que uma das principais causas de abandono das disciplinas pelos não-cotistas seria a incompatibilidade de horários. Como se pode notar, apenas um lado da questão foi abordado. Será que, por algum momento, chegaram a pensar que incompatibilidade de horários pode acometer também alunos cotistas? Que enquanto um não-cotista tem dificuldade de administrar seu horário por fazer cursos de línguas, informática, freqüentar academia, entre outras coisas, um aluno cotista tem dificuldade de se manter na universidade ao mesmo tempo que trabalha? E o cotista desempregado? Houve preocupação em saber como ele faz para se conduzir até a universidade? Seus gastos com xerox e alimentação? Isso sem falar que ele ainda precisa manter sua casa. E veja que isso está intrinsecamente ligado à não cobertura deste aluno por uma estratégia de permanência séria e comprometida. Estes fatores exercem efeitos tanto sobre os cotistas empregados – ou sub-empregados – quanto desempregados. Estes alunos necessitam despender mais tempo e energia para que se mantenham nas universidades. Se houvesse um trabalho como o que há uma década ocorre na Pontifícia Universidade Católica - RJ, que isenta em 100% os alunos oriundos de pré-vestibulares populares das mensalidades e fornece bolsa-auxílio, aí sim teríamos como comparar desempenhos de cotistas e não-cotistas.
Na PUC-RJ, estes alunos mantêm um rendimento superior aos demais alunos por contar com uma estrutura preparada para recepcioná-los. E o que impede que as universidades estatais façam o mesmo? Tentam a todo custo camuflar a incompetência e inoperância dos órgãos públicos e transferi-las para os cotistas, como se eles fossem os incapazes. Se a UERJ realmente estivesse preocupada em evitar distorções, utilizaria critérios mais justos inclusive no seu processo de avaliação dos requerimentos de isenção de taxa de inscrição do seu vestibular, onde não se avalia as reais condições sócio-econômicas dos candidatos. O que se faz necessário não são estudos com este caráter e para esta finalidade, mas se despir das demagogias e implementar ações que busquem realmente dissipar as desigualdades sociais e étnico-raciais.
*Helio Ventura é cientista social, militante do PVNC e do Coletivo de Estudantes Universitários Negros do Rio de Janeiro e é membro do Programa Ação Durban do CERIS.
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